Tuesday, December 15, 2009

ALMODÓVAR NUNCA ERRA?

Texto: Fábio Ávila Arcanjo

As verdades absolutas são quase sempre nocivas em qualquer tipo de texto, pois elas partem de um clichê e generalizam determinado juízo de valor deixando o espírito crítico contaminado. Geralmente, é possível encontrar pessoas que utilizam tais verdades para analisar trabalhos de alguns diretores. Afirmações como “Os grandes filmes do Spielberg estão no passado”; “Woody Allen sempre acerta” são lugares-comuns e não contribuem para a construção de uma análise bem feita.

Todo esse prólogo tem como objetivo tentar evitar cair nesses clichês ao analisar o novo filme de um diretor idolatrado cujo conjunto da obra justifica todo esse culto que é prestado. Estou falando de Pedro Almodóvar e seu novo grande filme, “Abraços partidos”. A frase feita geralmente atribuída ao espanhol é a seguinte: “Almodóvar nunca erra”.

E querem saber de uma coisa? É muito difícil contestar essa afirmação, ainda mais pra mim que sou fã confesso da obra desse genial cineasta. Muitas pessoas afirmaram que “Abraços partidos” esta longe de ser o seu grande trabalho. Apesar de concordar relativamente com a afirmativa, é inegável que o filme tem grande valor em sua extensa filmografia. Elementos característicos estão mais uma vez presentes, como: paixões avassaladoras, reviravoltas surpreendentes, amores, desamores, traições. Há um diálogo muito intensificado com “A Má Educação” (2004), em minha opinião, um dos melhores filmes do diretor, pois “Abraços Partidos” é extremamente metalingüístico, na medida em que ele analisa o fazer cinema.

O filme tem como figura central, uma personagem masculina, embora a participação da musa do cineasta, Penélope Cruz, seja muito significativa. Lluís Homar, em atuação impressionante, interpreta Mateo Blanco, um cineasta que fica obcecado por sua atriz principal, Lena e acaba vivendo um romance tórrido com ela. Porém, um acidente de carro muda toda a trajetória do diretor que acaba ficando cego. A perda da visão, sentido vital para um diretor de cinema, configura-se em uma mudança na identidade de Mateo que acaba adotando um nome peculiar: Harry Caine e se dedica a escrever, ajudado por sua assistente Judit, a excelente Blanca Portillo e pelo filho dela, Diego (interpretado por Tomás Navas). A entrada de um misterioso personagem intitulado Ray X é o catalisador para que muitas verdades surjam à tona. A cena em que Judit revela para Mateo e Diego alguns segredos que estavam enterrados é impressionante e demonstra a grande capacidade que Almodóvar tem em dirigir seus atores. Blanca Portillo está impecável, mas o destaque fica por conta de Lluís Homar, que havia feito uma participação pequena, mas significativa em “Má Educação”. Em “Abraços partidos”, o ator espanhol confere uma atuação que é digna de louvor.

A produção faz diversos saltos no tempo, o que não atrapalha em nada a fluidez do roteiro. Apesar de possui uma aura trágica, existe um alívio cômico que se faz presente no filme que Mateo Blanco dirige, pois se trata de uma comédia e o diretor faz um interessante contraponto entre a narrativa dramática e a cômica. Inevitável não lembrar de Melinda e Melinda (2005), do grande Woody Allen, mas aqui, diferentemente do trabalho do cineasta americano, Almodóvar não foca as suas lentes para a diferenciação entre os dois estilos, ele apenas utiliza esse elemento para enriquecer a sua bem acabada estória.

Eu costumo dizer que tenho certa inveja das pessoas que puderam assistir no cinema o lançamento de obras de Federico Fellini, Billy Wilder, Luchino Visconti, entre outros. Porém, é um alívio saber que existem diretores como Pedro Almodóvar, que além de atenuar esse tipo de frustração, conseguem transformar o simples ato de assistir um filme em algo indescritível.

No comments: