Wednesday, May 24, 2006

O filme dos filmes


Quando escutei pela primeira algo sobre o "Cidadão Kane" pensei logo que seria um filme, no mínimo, chato. Nas minhas diversas idas à locadora sempre esbarrava com a fita (na época não havia dvd), na prateleira dos clássicos. Comecei a fazer jornalismo e o dito continuava a me perseguir. Era Kane pra cá, Kane pra lá! Foi então que minha professora de Fundamentos de Cinema passou trechos do filme e eu percebi o tamanho da minha ignorância. Tratei logo de alugar e assitir, e a cada sequência eu me impressionava mais. Ele trata da manutenção do poder e de como esse poder pode afetar a vida das pessoas, principalmente pessoas inocentes como uma criança. Kane também fala da importância das coisas simples da vida, como um trenó. Muitas pessoas podem preguntar: o que faz de "Cidadão Kane" o melhor filme de todos os tempos (escolhido pelo American Film Institute em 1998)? Depois das revoluções causadas por Griffith e seu "O Nascimento de uma Nação" e por Eisenstein e "O Encouraçado Potemkin"; Orson Welles trouxe o que podemos chamar de cinema moderno. Ele não foi o primeiro a introduzir flashbacks, mas a maneira como ele utilizou esse recurso é que pode ser considerada inovadora; o filme inteiro é um grande flashback. Ele não foi o primeiro a trabalhar o sentido de luz e sombra (coisa que o expressionismo já realizara), mas soube utilizar isso como uma homenagem à escola alemã e com isso deu características específicas aos diferentes momentos da vida do personagem principal.
O filme é um amontoado de histórias que recriam a tragetória do "fictício" maganata da imprensa americana Charles Foster Kane. Seu início obscuro contrasta com a sequência do cine-jornal em que o diretor mostra, de forma rápida e funcional, toda vida de Charlie Kane; para depois se ater aos sentimentos e opiniões particulares que pessoas próximas tinham dele. "Cidadão Kane" trouxe para Orson Welles o devido reconhecimento artístico, calando a boca de muitos que não acreditavam no talento daquele jovem debutante em cinema, mas foi também o responsável pelo início da decadência do diretor. O milionário da imprensa americana, William Randolph Hearst, se identificou com Kane e partiu numa batalha para destruir o filme. Sua influência em Hollywood era enorme e ele trabalhou incessantemente para que Kane não fosse lançado. Hearst não conseguiu e o filme estreou em primeiro de maio de 1941, mas o boicote que seus jornais fizeram ao filme levou Kane a fracassar nas bilheterias o que quase causou a falência do estúdio RKO. No Oscar, Kane estava concorrendo a 8 prêmios, inclusive melhor filme, mas venceu apenas Melhor Roteiro, que Orson Welles precisou dividir com Herman J. Mankiewicz. "Cidadão Kane" só conseguiu um lugar ao sol 20 anos após seu lançamento. Depois dos estudos que o crítico André Bazin realizou sobre o filme ele foi apontado pelo British Film Institute, em 1962, como a obra cinematográfica mais importante de todos os tempos. Ainda hoje ele apresenta criatividade narrativa, originalidade técnica e beleza visual, "Cidadão Kane" pode e deve ser considerado como o marco zero do cinema moderno.

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